SEXTA-FEIRA, 14 DE NOVEMBRO DE 2008
Por Paulinho Passarinho, no Correio da Cidadania
No último final de semana, o chamado G-20 financeiro (que não deve ser confundido com o G-20 das rodadas de negociação da OMC) realizou reunião em São Paulo, com a participação de ministros de Estado e presidentes de bancos centrais dos países que compõem esse fórum. Foi uma reunião preparatória do encontro a ser realizado no dia 15 de novembro, em Washington, que reunirá os presidentes e chefes de governo deste grupo de países, composto pelas nações mais ricas do mundo – o G-7 –, acrescido pelos países considerados em desenvolvimento, dentre os quais se inclui o Brasil.
O tema em discussão é a crise financeira e econômica global, que cada vez mais se manifesta não apenas nos circuitos financeiros, atingindo também de forma grave a economia produtiva, com reais perspectivas de redução do ritmo de atividade econômica, concordatas e falências de empresas e desemprego em massa. O FMI já prevê que em 2009 iremos experimentar a primeira recessão global desde o fim da segunda guerra mundial.
Além de generalidades que me parecem inócuas, como o clamor por reformas urgentes no FMI, no Banco Mundial e nas bases do sistema financeiro mundial – que são defendidas pela maior parte dos países, mas que não sensibilizam aos Estados Unidos, o principal beneficiário do status quo –, a principal sinalização desse encontro foi a sugestão apontada para os países reduzirem as suas taxas de juros e aumentarem os seus gastos públicos.
O ministro da Fazenda do Brasil, que inclusive presidia o encontro, logo esclareceu que "por enquanto (aqui no nosso país) nada muda em relação à questão fiscal. Mas, se necessário, se houver motivo, nós podemos usar mais o fiscal, fazendo mais investimentos no setor público". Por sua vez, o verdadeiro ministro da economia, o presidente do Banco Central Henrique Meirelles, destacou posteriormente que essa conclusão sobre o encontro era equivocada. Respaldado por uma reunião promovida pelo Banco de Compensações Internacionais (BIS), um dia após o enceramento da reunião do G-20, Meireles lembrou a importância de "políticas monetárias saudáveis" – um eufemismo para as políticas de arrocho – e voltou a acenar com o fantasma da inflação, citando que nas economias que enfrentam depreciação de suas moedas, como é o caso do Brasil, as pressões inflacionárias podem ser mais persistentes. O presidente do Banco Central, assim, vocalizou o que já havia sido divulgado pela ata da última reunião do Comitê de Política Monetária, quando a taxa básica de juros foi mantida em estratosféricos 13,75% ao ano, no mesmo dia em que o banco central americano reduzia a sua taxa de 1,5% para 1% ao ano.
O que constatamos é que, apesar da reconhecida sorte do presidente Lula, parece que agora ele está menosprezando os caprichos da história que, na prática, estão lhe concedendo uma nova oportunidade. A partir do compromisso assumido por Lula em 2002, com a Carta aos Brasileiros, ele, o PT e os demais partidos de esquerda - que até então sustentavam as principais bandeiras de luta contra a ditadura dos bancos e transnacionais sobre a condução da economia no país - mudaram totalmente de posição e passaram a defender o que antes combatiam.
Lula procurou construir, desse modo, um tipo de governabilidade que aliou a manutenção dos privilégios dos setores dominantes com políticas de redistribuição de rendas para os mais pobres, para aqueles que ganham até três salários-mínimos. A exuberante conjuntura internacional garantiu o sucesso da sua opção, especialmente em termos eleitorais.
O custo desta opção foi por demais caro ao país. Congelamos as promessas de uma reforma agrária; elevamos o agronegócio como o principal modelo de ocupação do campo brasileiro; mantivemos o processo de desnacionalização do parque produtivo do país; demos seqüência aos leilões de petróleo; acomodamos os interesses privados, e caríssimos, no setor elétrico; não somente não realizamos uma revisão das criminosas privatizações de FHC, como demos continuidade às mesmas, inclusive em áreas vitais de serviços públicos, como é o caso das estradas de rodagem. Acima de tudo, não aproveitamos a conjuntura política que na América Latina se abriu, com a emergência de países em francos processos de transformação social, impulsionados pelas derrotas dos projetos neoliberais até então em curso.
Agora, a crise internacional daria a Lula a oportunidade de um reencontro com suas antigas posições. O país encontra-se vulnerável aos especuladores e empresas estrangeiras. As remessas de lucros nesse ano, até o mês de setembro, atingiram a cifra de US$ 27,5 bilhões, representando um acréscimo de 84% em relação ao mesmo período do ano passado. Apesar da propalada "blindagem" de mais de US$ 200 bilhões das reservas externas, sabe-se que em decorrência do elevado passivo externo de curto-prazo esse montante de recursos será insuficiente para segurar a fuga de capitais, já em curso. O generoso cheque especial do FED norte-americano, de US$ 30 bilhões, apenas sinaliza que é chegada a hora de se encerrar a temporada de jogatinas arriscadas, mas rentáveis até agora. Os dados referentes aos resultados das transações correntes do país mostram que o país volta a depender de recursos especulativos, ou mais desnacionalizações, para continuarmos a respirar.
A rigor, os compromissos de Lula, a partir da Carta aos Brasileiros, parecem irreversíveis. O presidente, depois de procurar garantir liquidez ao sistema financeiro e ao agronegócio, no momento mais agudo da crise se volta a seu berço operário, procurando garantir crédito às montadoras de automóveis. Depois de ter concedido uma linha de crédito especial de R$ 4 bilhões para o setor, através do Banco do Brasil, agora assiste ao governador de São Paulo "cooperar com o governo federal" – as palavras foram de José Serra – e, com a presença de Guido Mantega, vê-lo anunciar a liberação de nova linha de crédito para o setor, no valor também de R$ 4 bilhões, com recursos da Nossa Caixa.
Trata-se de uma generosidade do governador de São Paulo que possivelmente acabará sob responsabilidade do governo federal, pois se encontram em andamento as negociações para a compra da Nossa Caixa pelo Banco do Brasil. Não restam dúvidas que uma crise de desemprego neste setor agravaria a dimensão social dos problemas que certamente enfrentaremos. Entretanto, a preocupação maior do governo parece ser a manutenção de condições para as montadoras continuarem a enviar recursos às suas matrizes, como forma de compensação dos prejuízos que essas empresas sofrem em seus países de origem.
Não é possível desconhecer que este setor automobilístico é o que mais envia remessas de lucros para o exterior, seguido pelos setores metalúrgico e financeiro. Somente de janeiro a setembro deste ano, foram remetidos para as matrizes das filiais aqui instaladas US$ 4,8 bilhões, representando um aumento de 180% em relação ao mesmo período do ano passado.
Para uma ajuda desta natureza, o mínimo que deveria ser exigido é que essas remessas de lucros para o exterior viessem a ser interrompidas. Para falar o mínimo, pois a própria natureza predominante da produção das montadoras, carros de passeio, é hoje um fator de grave desequilíbrio das condições de vida de nossas grandes cidades, inundadas por veículos particulares, em meio à crise estrutural dos transportes públicos.
Com medidas desse tipo, mantemos a vulnerabilidade de nossa economia e ampliamos a possibilidade de erosão de nossas reservas internacionais, variável que deveria ser protegida ao máximo, como fator essencial para a adoção de mudanças macroeconômicas que nos coloque em um outro rumo.
Paulo Passarinho é economista e vice-presidente do Conselho Regional de Economia do Rio de Janeiro.
Postado por Hudson Luiz Vilas Boas às 08:55 2 comentários
DESPESAS COM REFORMAS ESTÁDIOS PARA COPA 2014
Chegou ao meu conhecimento, e muitos devem saber igualmente, que para sediar a Copa de Futebol de 2014 o país gastou verdadeira fortuna em publicidade apelativa. Agora, um PPS recebido de amigos esclarece o montante que se irá gastar para a reconstrução - reformas em estádios já existentes - e construções de novas arenas para a prática futebolística.
O dinheiro não virá dos clubes, pois que a maioria deles anda na "corda bamba", financeiramente falando; muitos agremiações esportivas se acham mesmo no "vermelho": salários atrasados, encargos sociais nas mesmas condições e outros problemas inerentes ao mundo de negócios do futebol. Pois pasmem: o montante dessa despesas com estádios para a Copa de 2014 atingirá, de saída, R$ 5.713 bi. É uma "bagatela", para um país que nada em dinheiro, que distribui entre os países irmãos vultosas somas, que perdoa dívidas elevadíssimas aos países africanos e ainda financia não sei que obras ou situações na Grécia. Melhor é lacrar os cofres da Previdência, a fim de se evitar futuros transtornos àquela instituição e aos seus beneficiários.
O dinheiro não virá dos clubes, pois que a maioria deles anda na "corda bamba", financeiramente falando; muitos agremiações esportivas se acham mesmo no "vermelho": salários atrasados, encargos sociais nas mesmas condições e outros problemas inerentes ao mundo de negócios do futebol. Pois pasmem: o montante dessa despesas com estádios para a Copa de 2014 atingirá, de saída, R$ 5.713 bi. É uma "bagatela", para um país que nada em dinheiro, que distribui entre os países irmãos vultosas somas, que perdoa dívidas elevadíssimas aos países africanos e ainda financia não sei que obras ou situações na Grécia. Melhor é lacrar os cofres da Previdência, a fim de se evitar futuros transtornos àquela instituição e aos seus beneficiários.
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